Mas afinal, o que é Governança Corporativa? De forma simples é “gerir uma empresa”. De forma complexa é “como fazer”.
A Governança Corporativa tem 4 princípios básicos que recorrendo a eles como alicerce máximo, as outras recomendações são acessórias. Transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa são os princípios que devem embasar a gestão de uma corporação.
O marco inicial da Governança Corporativa, por volta dos anos 80, ocorreu quando Robert Monks (advogado e também acionista) problematizou que devido à dispersão de propriedade e responsabilidade dos acionistas em uma empresa, os administradores poderiam enriquecer sem que precisassem prestar contas do faturamento aos acionistas. Sugeriu, então, que as empresas deveriam ter um monitoramento eficaz para aumentar o seu valor e gerar riquezas de maneira igualitária. Sua ideia consistia em dar voz aos acionistas, levá-los a participar dos processos decisórios . Em resumo, foi o pai dos princípios que sustentam a Governança Corporativa.
Seguido do Relatório Cadbury (Comitê constituído no Reino Unido em 1992, para definir responsabilidades de conselheiros e executivos, visando à prestação de contas e transparência), os Princípios da OCDE (de 1998, visando o funcionamento das corporações e principalmente dos mercados de capitais), e a Lei Sarbanes–Oxley (aprovada em 2002 pelo Congresso dos Estados Unidos) aprimoram o fomento do tema e constituem a doutrina base da Governança.
No Brasil, o assunto ganhou força apenas na década de 90. Considerando que as empresas brasileiras passaram a ter acionistas estrangeiros, que tornaram-se exigentes à existência de boas práticas corporativas, foi criado em 1995 o IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa), responsável pelo desenvolvimento das melhores práticas de Governança Corporativa no Brasil. No entanto, a história diverge da prática, pois somente nos últimos anos as empresas brasileiras tem se mostrado engajadas a aplicar de fato esses princípios, forçadas por uma mudança comportamental de moralidade.
Os princípios cooperativistas estariam, então, mais próximos às boas práticas de Governança Corporativa se comparados a outros modelos societários? Em tese, sim, porque como gosto de enfatizar, princípios não aplicados orbitam na teoria. A prática dos princípios da Governança, nesse caso, pode prevalecer à existência de uma burocrática documentação, considerando não ser exigido das cooperativas a mesma formalidade documental necessária a uma empresa de capital aberto, por exemplo (Lei das Sociedade Anônimas – 6.404/76 e Instruções da CVM – Comissão de Valores Mobiliários, autarquia vinculada ao Ministério da Economia do Brasil).
Como praticar a Governança Corporativa em uma cooperativa, então? A resposta não é tão simples, pois a lei que rege essa figura societária é da década de 70 (Lei 5.674/71), anterior ao debate do tema. Deve-se então importar alguns critérios, sejam eles legais, aplicados às S.A.s ou o bom e velho bom senso da moralidade (ética para alguns filósofos, moral para outros, segundo a doutrina que rege e diverge sobre o assunto).
Incontestavelmente, antes de adotar estruturas de gestão, o gestor da cooperativa deve se perguntar: os 4 princípios básicos (transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa) são protagonistas na minha cooperativa?
Se a cooperativa disponibiliza informações genuínas, respeitando a participação societária dos cooperados de forma igualitária, fundada no compromisso de prestar contas do investimento de seus cooperados e sua destinação, mantendo ainda um olhar para o coletivo (o arremate da responsabilidade social/corporativa) a cooperativa estará no caminho. Constituída nesses princípios, a criação de órgãos de Governança que se mostrem eficazes a gerir e monitorar a empresa (Sócios/Cooperados, Conselho de Administração, Gestão, Auditoria Independente, Conselho Fiscal, Conduta e acrescento aqui o Compliance também) o mapa da Governança Corporativa começa a ser desenhado e ganhar forma.
Não há uma receita de sucesso. O que funciona para uma cooperativa, pode não fazer sentido para outra, pela própria natureza da atividade, por isso, mais do que princípios (como já dito, orbitam na teoria quando não aplicados) é fundamental que haja uma análise com uma boa dose de autocrítica ao status quo – em bom português, o estado atual – da empresa, para então, desenvolver um modelo que se adeque à realidade, sem, contudo, abandonar os princípios norteadores e a ética, como alavanca das boas práticas.
(Publicado em 09/06/20 em https://www.mundocoop.com.br/artigos/governanca-corporativa-nas-cooperativas-juliana-bernardo-e-advogada-e-professora-de-governanca-corporativa.html)
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